30 novembro 2010

Preciso da alma!


Veste-me de corpo
dá-me cor
abjecta-me
paixão sem fervor
não qualidades de amor
consciencializa-me
alimenta-me o espírito
num segredo interior
musicaliza-me o grito
esculturado de calor
entrega-me tudo que é meu
... por favor!


por Rosa Magalhães

26 novembro 2010

Cinderela

Aquela amizade incondicional entre mim e a vassoura era terrível, ela era maior que eu e chegada a prenda do aniversário, outra vassoura de palmo e meio tal como eu. Os dias varriam-me Cinderela em tons avermelhados, quase inseparáveis. O sonho dos contos de fada já existia, havia um castelo e o príncipe encantado na fantasia e eu, a princesa amada, mas só havia uma miniatura de vassoura. A vocação parecia dona da casa, queria crescer a ficar do tamanho da grande vassoura, continuei a sonhar e foi meio palmo de caminho andado nessa espera. O príncipe encantado há-de chagar no tempo acertado.


Rosa Magalhães no Concurso: “Imagens da Nossa Memória”
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Saudades


Aqueles fins de tarde, o cheirinho a pequeninas sardinhas fritas, o arroz de tomate passado a fugir prato fora, uma manta no chão uma novela Cravo e Canela, a Gabriela do início. Um tanque cheio de água. Flores por toda a parte e aquela figueira que depois mais tarde secou por mãos duma vizinha malvada que supostamente com sal a matou. Um cão amarelo baixinho e as formigas que faziam carreiras a querer chegar à cozinha. Um cachimbo sentado no cadeirão, a porta da sala esbranquiçada até cima com vidros decorados a madeira, um puxador mármore, o avental da mãe e aquela alegria de ser criança.


Rosa Magalhães no Concurso: “Imagens da Nossa Memória”
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Fiz 4 anos


Aquele homem alto e elegantemente bem trajado era meu pai que acabava de chegar a casa e, “roubou-me” a chupeta que trazia na boca. Estarrecida, soltei a choradeira sem fôlego, 4 Anos e de chupeta na boca? - Disse zangado! Pegou na tesoura e zás cortou-a a meio alegando que eu, iria perder a mania. Arrasada corri a agarrar-me às pernas da mãe onde escondi a cara banhada de tanto chorar. Que chatice que era fazer 4 anos de idade! Afinal, aquela era a minha chucha mas meu pai não sabia. Lá terminou bem o dia, o calor da mãe é sempre mãe e os mimos a esquecer tamanho desagrado.


Rosa Magalhães no Concurso: “Imagens da Nossa Memória”
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Óculos Graduados


Esquadrinhei bailes entre campos de flores amarelas que o vento soltou e levou no vestido, de um lado. Do outro, o milho crescido por onde corri escondida dos amigos. Os voadores gansos bravos espantaram o caminho num salto estouvado que nos deitou por chão e rimos, rimos tanto na barriga e o vento levou-nos como se fossemos gansos bravos, noutra intenção. - Oh, uns óculos! Disse. Peguei na preta armação quadrada de lentes fortes quando vi quem passava. Uma freira que sorria de rigor vestida de branco. Confiei-lhe nas mãos para que guardasse, pois poderia ser de alguém que deles precisasse.


Rosa Magalhães no Concurso: “Imagens da Nossa Memória”
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Bonecas


Era uma vez por semana, num encontro organizado por adultos que nos vestiam a rigor para a festa. As mães eram as donas das bonecas, também havia padrinhos e os convidados eram todos os meninos da rua. Da família, os primos mais chegados e o padre o mais novo que obedecia. Iniciava-se a procissão pelo passeio a cima, seguíamos até à igreja que ficava lá no cimo da rua, na entrada de uma casa vazia já velha. No altar flores, água e uma toalha. O padre benzia as bonecas e só depois era convidado de honra. Voltávamos, em marcha lenta até casa... e a festa começava.


Rosa Magalhães no Concurso: “Imagens da Nossa Memória”
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Sono da madrugada


Duas da madrugada. O calor abria janelas do sono que não aguentava a mente quebrada, o corpo cansado e o relógio que batia ponteiros de silêncio. Acontecia às sextas e mesmo ensonada gostava do que via lá fora, na rua homens pendurados nos ombros formavam o cordão humano que ocupava a largura da rua larga. Nas cabeças, chapéus com penas e nas pernas calças presas em suspensórios sem chegar aos joelhos. Nos pés rebolavam bidões de cerveja e no ar alegrias de caras, quase exaustas, cantaroladas por tradicionais cantigas quase embriagadas. Fascinada com tamanha imagem, a minha janela adormecia.


Rosa Magalhães no Concurso: “Imagens da Nossa Memória”
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Um baloiço só

Queremos um baloiço maior! Dissemos em coro. Éramos cinco para um só baloiço. Sem regras quisemos divagar o instante e o baloiço, era espaço tão pequeno! Tocou o telefone. Fomos lá atender e dissemos: “- não está ninguém em casa” e depois, escapamos. Muito ajustadas lá conseguimos caber no baloiço. Umas ao colo das outras e duas em pé seguradas à corda, mas faltou força para baloiçar devido ao excesso de peso. Repentinamente e sem contar o baloiço deu meia volta no ar que ficamos todas no chão de pernas pró mesmo! – A voz soltou-se: - eu avisei! Ainda vos ides magoar!


Rosa Magalhães no Concurso: “Imagens da Nossa Memória”
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Só areia


Não, não abras a janela! Gritava desesperada. Mas ela, sim ela, a janela abriu-se e entrou só areia! Areia, só areia, era tanta que entrava pela janela e eu, do lado de dentro a ver, toda aquela areia, que não parava de entrar! Chorei, gritei e ninguém veio socorrer-me! Ninguém me ouvia! Então gritava! Senti-me a sufocar com tanta areia que me cobria. Era só areia que entrava, tanta areia, que de repente, acordei! Acordei tão depressa e sem ar, quase não podia respirar. Depois, pus-me a olhar, olhei tudo à minha volta e caí na real cena, que foi cena de um sonho que estava a sonhar.


Rosa Magalhães no Concurso: “Imagens da Nossa Memória”
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Depois da verdade só há verdade



No meio de um sonho atribulado, acordei aflita que nem sabia onde estava. Aticei a luz e sentei-me a escutar que barulho seria. Escutei, voltei a escutar e tive na sensação, um equídeo que corria rua abaixo-rua acima. O medo enrolou-me cabelos no cobertor mas não quis abafar o raciocínio para ouvir se era sonho o que escutava. Senti o atracar ferino num ir e voltar nessa corredora onde estremeci mais ainda com o guinchar do ferro no chão a derrapar o travão arrebatado que me dava a sensação ser em baixo e em cima, da rua. Interrogo ainda a razão de todos em casa, ser eu quem ouvia.

Rosa Magalhães no Concurso: “Imagens da Nossa Memória”
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16 Gatos


Farruca era mãe da Katza, as gatas mimadas lá da casa. Com duas ninhadas sumidas, desconfiamos a seguir rastos estranhos até vermos um saco a mexer à margem do rio. Lá dentro, todos os gatinhos vivos. Foi na adega dos vinhos, que todos os dias alimentámos os gatos que cresceram sadios e miavam mais alto a acordar a família! Viram-se gatos já crescidos por todo o lado e como eram vadios foram em busca de outros destinos. De novo, a Farruca e a Katza, as duas gatas mimadas lá da casa. A Farruca, mordida por um cão morreu e a Katza de velhinha. Até hoje nunca mais tivemos gatos!


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Rosa Magalhães no Concurso: “Imagens da Nossa Memória”

Cresci


O fim duma etapa é crescer mas não sabia. Concluía-se o ser criança no primário da vida. Fui à escola numas longas tranças negras e a verde saia xadrez demarcou aquele dia. Carteira sim carteira não havia uma espera silenciada. Levanta-te! Quase gritou o professor que me fazia faces rosadas. Passeei pela sala e não entendi porque ninguém estava assim tão asseado, escutei a vaidade com pena dos que ouviam, afinal era o exame oficial da 4ª Classe disse, para juntar àquela linda apreciação. Veio a memória do constrangimento que marcou o quão especial era aquele evento.


Rosa Magalhães no Concurso: “Imagens da Nossa Memória”
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Na fogueira



Fugimos sem olhar para trás, demos por terminado o belo e fresco passeio matinal quando passamos pela linda arquitectura baixa. O imenso relvado decorava-a, na vasta área circundante. Um porco bicho gigante num espeto e por baixo uma fogueira assustada. Éramos crianças e o frio apoderou-se de nós que nos obrigamos a recuar na direcção de volta a casa. O sentimento ficou-se pelas rodas que correram tão apressadas pelo caminho longo que nem os pés deixaram de pedalar um segundo. Ficou a fotografia registada no livro marcado das memórias, para garantir o flash mental dessa intimidade.


Rosa Magalhães no Concurso: “Imagens da Nossa Memória”
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Cemitério de Grefrath, um paraíso



Entre memórias vagas tenho a mente pendurada na saudade, uma saída escondida e uma porta gasta rumo ao espaço mágico, um baloiço pendurado, vazio e um corredor esguio lá fora decorado com tulipas e rosas de ambos os lados, ao fundo uma cancela por onde escapei. Passei para o lado de lá da rua sem ninguém me dar a mão, caminhei e entrei. Entre chilreados e árvores sentei-me no meio de tão lindo jardim, escutei o silêncio. Vi senhoras de chapéu embraçadas nos maridos. Ali, não faltavam flores no paraíso que por cá nunca vi! Aqui, parece a casa de terror.


Rosa Magalhães no Concurso: “Imagens da Nossa Memória”
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Impotância da comunicação
Todos os dias Marcus tocava na campainha da porta da minha casa. Ficava ali especado à espera que eu aparecesse na janela só para dizer, um adeusinho. Depois, desembaraçava a bicicleta que decaía pelas pernas a tombar no chão e seguia lépido num acelerar de pedais, pela rua. Grefrath, era uma Vila muito sossegada situada a Norte da Alemanha, onde morei dois anos. Um dia, Marcus atirou-me um beijo e fugiu de novo. Noutro dia trouxe os amigos com suas bicicletas e mais tarde entendi a importância da comunicação. Vi que Marcus, queria que eu também fosse brincar e andar de bicicleta!


Rosa Magalhães no Concurso: “Imagens da Nossa Memória”
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24 novembro 2010

Comunidade de Leitura Dramática

“O Despertar da Primavera”
de Frank Wedekind

Frequentei a Oficina de Leitura Dramática
com início a 08 de Novembro 2010
e contou com uma apresentação pública da Obra
“O Despertar da Primavera” de Frank Wedekind
no Salão Nobre do Theatro Circo em Braga
nos dias 22 e 23 de Novembro 2010 pelas 21,30h

Acção inserida na Comunidade de Leitura Dramática
com orientação de Jaime Soares.

Os ensaios foram muito intensos mas positivos.
Adorei a experiencia!

Fotografia feita por Vera Gomes
no 1º dia da Oficina, numa das salas novas dos fundos do Theatro Circo.
Companhia de Teatro de Braga, no âmbito do Projecto BragaCult (CTB)



 O despertar da primavera de  Frank Wedekind, é uma obra "tragédia" do fim do seculo passado, numa peça inspirada em acontecimentos reais da vida do próprio autor. Dois de seus colegas de escola que cometeram suicídio em 1883 e 1885. A sequência de cenas bem articuladas, o diálogo expressivo e lírico, os elementos visionários e surrealistas, indicam o autor como um precursor do drama expressionista. A história gira em torno de um grupo de jovens que se veem confrontados com os problemas da instabilidade psicológica causada pela puberdade e da distância que os separa da moral social ante suas curiosidades sexuais. Wedekind aproxima-se da interioridade dos jovens de tal forma que consegue desvelar, diante de nossos olhos, suas alegrias e tristezas, esperanças e desesperos, lutas e tragédias."